“A vida acontece de uma vez só”, disparou a minha terapeuta sem muitos rodeios. Diante do meu arregalar de olhos, ela ainda emendou: “Não dá para esperar para resolver um assunto por vez porque tudo está acontecendo em todas as áreas agora e, neste momento, a vida está te ensinando a desenvolver habilidades e jogo de cintura”, concluiu. Murchei na cadeira e suspirei. Estava me sentindo um personagem do Desventuras em Série, com o Conde Olaf sendo a minha própria vida. Que horas viria o final feliz?
Passei uns dias digerindo a fala. E foi quando consegui admitir para mim mesma que eu navegava no caos tentando me agarrar aos destroços dos últimos anos, que realizei a insistência em meu erro – eu não estava descansando. Desde que me lembro mocinha, e lá se vão mais de 30 anos, eu vesti a armadura da guerreira e só fui adiante. Não havia a menor hipótese de recuo ou descanso porque isso automaticamente me invalidaria diante do julgamento alheio. E eu fui. E eu quebrei. Aprender a juntar os próprios cacos sem se ferir não é tarefa fácil. Então, eu tive que parar.
Parar é diferente de pausar – na pausa você respira, recupera o fôlego e retoma a ação; parar denota conclusão. O que eu estava encerrando? E dali para frente, para onde eu iria? Com cuidado eu fui desmontando a minha armadura e tratei de guardar isso bem longe das minhas vistas. Me senti nua e vulnerável no começo, e com uma imensa vontade de desistir de tudo e encarnar o Sísifo. Dores já conhecidas doem menos?
Na sessão seguinte levei essa angústia, esse medo paralisante de concluir etapas e arquivar jornadas. Diante de uma escuta afetiva, elaboramos juntas que a vida em paz não é a ausência de tensão, como numa tarde de verão com chuva, arco-íris, bolo e café. A vida em paz é a tranquilidade de escolher o que se quer viver, com consciência, com presença, e sendo corajosa o suficiente para dizer não aquilo que já não faz mais sentido. Viver em paz é se permitir sentir. E isso é um aprendizado diário porque, ora veja, a vida acontece de uma só vez.
No meu tempo eu senti de por a cara na rua e a vida pra jogo. A ansiedade que me consumia por um triz quase fez um estrago. Respirei, tomei fôlego e fui para a ação. A vida consentida é sobre escolhas e não enfrentamentos.
Meio virginiana, meio libriana, jornalista e pretensa a escritora que acredita que a lentidão das manhãs de domingo dá o sentido para a pressa da vida; que bons dias são feitos de boas noites; em construção diária de histórias bonitas e que o autoamor é a ferramenta que permite o amor, em si, passar para dentro.
Mãe de um skatista que ama cinema e de uma vira-lata resgatada, a Eva, sigo a passos largos para os meus 50 anos.