Até me permiti uma segunda xícara de café para ter coragem de escrever este texto. Pequenas poções aromáticas que transmitem força.
“Eu me sinto constantemente presa no Castelo do Barba-Azul e toda vez que eu finalmente acho que consigo respirar, me deparo com uma chave sangrando e um quarto cheio de ossos”, isso simplesmente sai pela minha boca em uma sessão de terapia. “E de quem são todos esses ossos?”, ela me pergunta. “Todas as versões de mim mesma que eu deixei morrer ou não consegui salvar”, é tudo que eu consigo responder.
No curso Escrever com Alma, aprendemos junto com Virginia Woolf que nossa escrita transcende quando encontramos nosso dilema, um dilema de vida, aquele que cria uma conexão invisível com cada uma que se permite experimentar o texto. Para nós, mulheres, faz parte deste dilema escrever com a consciência do próprio sexo.
Vejo hoje como é gratificante e, ao mesmo tempo, tão pesado fazer algo que você ama, um tesouro conquistado lá das suas profundezas. A leveza de fazer o que sonha, utilizando tudo o que você sabe, contrapõe o peso insustentável do “e se…” der errado, não tiver dinheiro, ninguém entender, me julgar. É essa falta de equilíbrio que acaba com toda a nossa energia.
Uma foto bonita, um stories divertido ou uma conversinha boba no Whats são o suficiente para marcar que a vida toda está ótima, e talvez até estivesse naquele momento, mas no minuto seguinte lá estamos nós utilizando todas as forças para não ser mais uma presa do Barba-Azul.
Talvez, não deixar que o Barba-Azul me arraste pelos pés quando finalmente eu sinto que posso respirar seja o meu grande dilema.
Ninguém cria nada em estado de sobrevivência e é assim que estamos já algum tempo, uns com mais consciência, outros nem tanto. Há quem consiga levar a sério a ideia de separar o pessoal do profissional e manter o ritmo do feed, das redes, da vida social. Manter a luz da vida que está para fora enquanto a vida interna sangra até atingir um estado de anemia.
Criar precisa de integração, um ato de “aprender a navegar”, como eu gosto de dizer lá no curso. No entanto, quando a vida externa está se enganado com os luxos e belezas do grande castelo, a vida interna criativa sangra implorando por cuidado e atenção. É neste momento que eu fico em silêncio, quase em isolamento, tentando reunir um pouco de força para gritar (criar), nem que seja apenas para mim mesma: Socorro! Eu preciso de ajuda!
Esta versão não será mais uma ossada esquecida na pequena portinha do castelo do Barba-Azul.

Uma aquariana apaixonada por Jane Austen e outros romancinhos <3
Sou jornalista, arteterapeuta (em formação) e feminista. Acredito na transformação por meio da arte e escrita. Criei a Valentinas e promovo as oficinas e cursos de escrita criativa que acontecem por aqui. Amo conversar sobre criatividade e todos os filmes, séries e livros que me deixam por hooooras jogada no sofá.