Meus ciclos se encerrando me chamam todos os dias a continuar. Eles me olham nos olhos e contam de um por um todos os pedaços fragmentados de mim que já não me pertencem mais. São peças que contam a minha história, mas elas não falam mais. Mudas, estampam as paredes de um museu que eu nem sempre quero visitar.
São esculturas distorcidas e sem movimento de quem não sou mais, de quem por vezes tenho vergonha de olhar. Mas elas não sabem de mim o tanto que sei delas. Não foram fortes para ficar, não souberam farejar o perigo que eu corria enquanto me deixava levar.
Partes hoje imperfeitas que se encaixavam perfeitamente em mim, me deixando inteira, mesmo que a sensação não fosse essa. Meu corpo mudou instintivamente ao deixá-las cair e ficar para trás. Ele fez o que pode no tempo que teve para deixar tudo no lugar. E sim, estou culpando as partes, enquanto o todo que ainda ficou continua ouvindo da psicóloga que pego muito pesado comigo mesma. Mas só porque não existem mais, as partes que caíram continuam sendo quem eu já fui. Mas ficam lá no museu, mudas me observando com olhos atentos.
No fim das contas, sou tão capaz de destruir minhas partes de novo e esperar que elas se cansem de mim e se fragmentem, caindo ao chão como as outras. Me abandonando e fugindo para o museu que eu insisto em temer. Eu não quero olhar pra trás, no entanto, parece que é só isso que eu faço.
Eu me culpo e as partes olham pra mim com pena. Porque elas enxergam o que eu não sou capaz nem de olhar. Elas sabem que foram deixadas no processo em prol da construção de mim mesma. Elas se foram para me ajudar. São ferramentas da construção vasta em território e altura, enquanto eu me preocupo em erguer muros e paredes altas o suficientes para que ninguém de fato entre sem ter que arrombar. Ou para que eu mesma continue presa do lado de dentro sem ter forças nem pra gritar.
Elas sabem da verdade enquanto eu só enxergo distorção, fechando os olhos pra mim mesma. Não me pedem nada, mas no silêncio sei o que esperam de mim. Querem ser olhadas olho no olho sem que meu estômago embrulhe em desespero e medo. Elas esperam ser observadas e até mesmo admiradas, num passivo e confortável movimento de perdão. Mesmo mudas, fica fácil entender o que elas querem dizer. O que elas precisam de mim, me mostrando o que eu mesma preciso de mim. Mesmo rejeitadas, elas ainda tentam me ajudar.
Parece que confiam em mim cegamente para achar um caminho de volta que não me leva pra trás. Silenciosamente mostram que observar o museu de frente, com atenção e vontade, só vai me ajudar. Sussurram em compaixão que caminhar por ali de peito aberto pode me levar à paz do perdão. Observar com cuidado e ver que todas elas ainda tem meu coração. E que por mais que estejam fragmentadas, se juntam em um mapa que me dá além de caminho, permissão. Elas me deixam ir enquanto me imploram para não ter medo por causa delas.
Oi, sou a Carol. Nasci para criar e sou designer gráfico, escritora e empreendedora. Penso muito, choro por qualquer coisa e amo ver a vida através dos detalhes. Vivo para ser grande nas coisas pequenas e escrevo para me costurar no mundo. Acredito e confio na potência das palavras escritas no papel. Escrever é ter coragem, resistir, continuar e tomar o poder para si.
Ps. Em um relacionamento sério com o meu Kindle 🙂